No Largo do Arouche, São Paulo, capital, no final dos anos 30, o engenheiro Waldemar Clemente monta uma fabriqueta de materiais elétricos.
Em 1944, produz o primeiro liquidificador totalmente fabricado no Brasil.
A empresa passou a ser denominada Eletro Indústria Walita. O nome Walita foi inventado com parte do nome de Waldemar, e com nome de sua esposa, Lita Clemente.
Uma das ideias primordiais foi a demonstração de seus produtos nas lojas.
Nos anos 50, surgem os primeiros cursinhos da Escolinha Walita, nos quais os vendedores apresentavam os benefícios do uso dos aparelhos e a produção de receitas.
Nos anos 70, a Philips, cuja sede é na Holanda, comprou a Walita Eletrodomésticos Ltda, mantendo o nome fantasia.
Em 2010, a marca foi devorada pela padronização da Philips, mas, em 2011, ao que parece, decidiu-se que continuará a ser usada no Brasil.
Os cursinhos Walita tinham a marca da rapidez e da eficiência, conquistando a simpatia popular.
A Emenda Constitucional 19, ao imprimir na Constituição Federal, artigo 37, o princípio da eficiência, ao lado dos originalmente existentes da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, para disseminar a ideologia, considerada neoliberal por parte dos doutrinadores, também deu a seguinte redação ao artigo 39, no seu parágrafo 2º:
Art. 37, § 2º. A União, os Estados e o Distrito Federal manterão escolas de governo para a formação e o aperfeiçoamento dos servidores públicos, constituindo-se a participação nos cursos um dos requisitos para a promoção na carreira, facultada, para isso, a celebração de convênios ou contratos entre os entes federados.
Para atingir metas pretensiosas como a “formação” e o aperfeiçoamento dos servidores públicos, como requisito para a promoção, na prevalência do resultado, concretização do princípio administrativo da eficiência, a quantidade de cursos se projetava grandiosa, e a rapidez, corolário de sua efetiva consecução.
Ao lado de uma propaganda espetaculosa, estatística, números, cursos, “formação” e aperfeiçoamento, quais os cursinhos Walita de outrora, manifestam a marca do resultado, da rapidez e da eficiência.
Para a “formação” de alunos, de quaisquer níveis, criaram-se currículos escolares, delegacias e inspetorias de ensino, estrutura hierárquica e militarista para impôr pré-determinados programas de ensino, matérias específicas, comandos e plataformas como a preparar para o futuro a manutenção do status quo.
Professores, vinculados à ideologia, menos do que educadores, por vezes, no exercício de sacerdócio de sagrada missão, vítimas e protagonistas do sistema, acreditando que a palavra “professor” tinha a mesma raiz da palavra “profeta”.
Profeta é o que transmite a mensagem. Não fala em nome próprio, fala em nome de outrem.
Muitos professores transmitiam a mensagem prevista nos currículos escolares, submetidos a delegacias e inspetorias de ensino, “formando” alunos na medida determinada pelo sistema, projeto de padronização de comportamento visando ao operário padrão, cidadão padrão, modelagem social.
Em alguns países, melhor ser vítima do que estar à margem do sistema.
Nos pequenos países banhados pelo Oceano Índico, práticos, no exercício da gestão, se transmitem aos cidadãos, aos aprendizes, e aos servidores públicos, quais os comportamentos esperados, para que, nestes “padrões”, possam ser avaliados, em competência e nível salarial. No fundo, a pretensa educação capaz de brecar a progressão social.
Meros cursinhos de 60 horas, capazes de envenenar cursos de mais de 4.000 horas, recebem melhor valorização, em promoções e títulos para concurso público, numa rede de escolas públicas e particulares, empresas de consultoria e assessoria, privadas e públicas, colaboradoras e responsáveis pela elaboração de editais. Cria-se uma cultura que sacramenta apenas o valor próprio atribuído na órbita artificial interna da organização com desprestígio de toda a estrutura existente, seja na sociedade, seja de governos anteriores, em louvor de pequenos grupos, apaniguados pelo poder, cantados em prosa e verso pela inventada mídia, fantasia esfarrapada que não consegue cobrir o vazio e a falta do verdadeiro espírito republicano, plumagem de pavão, pés e alma de peru, razão de segregação, discriminação, desunião e conflito.
Na disseminação de inúmeros e velozes cursinhos, de participação obrigatória, revive-se a ideologia do “manda quem pode, obedece quem tem juízo”, de tempos ditatoriais, de acrítica mentalidade, e, em conluio com a iniciativa privada, que nestes cursinhos enxergam o filão dourado, revitaliza-se também a versão do mote de que “ o que é bom para a empresa privada, também é bom para o governo”.
Não que não se deva aproveitar da ciência e da arte da Administração para desenvolvimento de gestão, de competência e de avaliação de resultado, desde que de forma crítica, e não de forma propagandista em que a estatística da quantidade de cursos desenvolvidos e de servidores “formados” não seja um fim em si mesmo.
Embora o foco seja no resultado, não é um resultado a qualquer custo, porque o processo e o meio revelam e legitimam os fins. Não há que se retornar com o mote de que os fins justificam os meios. Aliás, deve ser o contrário.
Pelo processo, na valorização do meio sobre o resultado, desde que haja vez e voz, cidadãos, de não importa quais países, buscam o acordo, dentre os interesses divergentes, e decidem quais as normas, que brotando do exercício da cidadania, devam ser obedecidas pelos seus produtores, ainda que postados na longa fila das carências, rumo ao quimérico, mas necessário, e viável, estado democrático de direito, mais processo contínuo de aperfeiçoamento do que estágio final e permanente de estática realização.
O processo compreende a passagem da cultura, pelas palavras e pela imitação, de um novo tempo, em que se valorize a igualdade, porque, de acordo com Boaventura Souza, todos a ela têm direito sempre que a diferença diminui a dignidade do ser humano, mas também todos têm direito à diferença sempre que a igualdade os descaracteriza.
A escola, seja a comum, da vida de todos os estudantes, seja a de governos de republiquetas, banhadas pelo Oceano Índico, ultrapassando as estatísticas, não pode prescindir da problematização contextualizada, da busca de alternativas pragmáticas, do espírito crítico.
A valorização do meio e do processo no atingimento de resultados pensados, consensados, não se confunde com o fruto de uma mera obrigação imposta de cima para baixo pelos governantes para uma participação numérica, simbólica e efêmera e, por isso mesmo, tendente ao descompromisso e à alienação, para proveito mais propagandístico de tais governos do que para engradecimento pessoal e crescimento social, de um cidadão e de um servidor mais consciente de sua dignidade funcional.
A finalidade, ainda que pública, não prescinde da motivação intrínseca do aprendiz, na essência do seu querer aprender, e não na imposição de valores não queridos e de difícil assimilação compulsória de seu caráter obrigatório, fazer sem talvez, nem porquê, fazer por fazer, tolamente, obediência cega, servil e hipócrita.
A busca constante de aperfeiçoamento brota do contexto de problematização, em que a vontade livre e a consciência do aprendiz em comunidade são valorizadas justamente porque sabe que o verdadeiro motivo supera estatísticas e governos, se planta e se desenvolve no processo que, mais do que meramente escolar, relação “professor” e “aluno” vítimas do sistema, é sobretudo relação de “educador”, este sim, sacerdote que ajuda o crescimento, o aprimoramento da dignidade do ser humano, ser inserido na comunidade, mas único, diferente, essência da nobreza humana, rumo à cidadania, a verdadeira.